Artigo: Espírito Santo – um modelo de sistema penitenciário a não ser seguido | Por Cássio Rebouças

Arrisco dizer, mesmo sem conhecer a realidade de todo o país, que não há modelo a ser seguido. Não há dúvidas de que o Espírito Santo passou por mudanças positivas em relação ao sistema penitenciário, mas devemos nos lembrar que por causa do caos no sistema carcerário e socioeducativo do ES o Brasil sentou no banco dos réus da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o Estado foi obrigado a tomar medidas que mitigassem a situação calamitosa dos cárceres capixabas.

As melhorias vieram, mas com custos altos, e não apenas financeiros. A partir de licitações questionáveis e construção de presídios “modelo supermax”, a população carcerária passou de cerca de 2.900 em 2002 para os atuais 20.000 presos no sistema penitenciário capixaba.

Mesmo após a reforma estrutural dos presídios, ainda há problemas, alguns dos quais acompanhei de perto durante os seis anos em que trabalhei com direitos humanos. Antes, esclareço que não se trata da realidade em todos os presídios e alguns fatos podem ter se modificado. Um dos exemplos estava na comida dada aos presos, já que em uma das vistorias-surpresa foi possível constatar que as marmitas chegaram estragadas. Em alguns presídios femininos, havia relatos de que as presas menstruadas recebiam três absorventes por dia e para receber os três do dia seguinte eram obrigadas a mostrar os usados.

Os cortes de direitos como banho de sol, “convívio” na área comum, dentre outros, também continuam sendo relato constante, assim como a existência de bombas de gás dentro das celas, o que é preocupante. Em alguns casos, os banhos duram 90 segundos, o que, combinado ao calor, aos colchões pouco higienizados e ao pequeno número de trocas de uniformes/roupas, geram problemas frequentes de pele. Sem contar o “procedimento” que consiste em fazer presos tirarem as roupas e realizarem movimentos repetitivos (como agachamentos) por todo e qualquer motivo.

Esses são apenas alguns exemplos que mostram que, apesar das fachadas bem pintadas das penitenciárias capixabas, dentro da cadeia a situação não é nada bonita. Sempre que estamos diante de problemas complexos como segurança pública e sistema penitenciário, levantam-se vozes brandindo soluções, muitas delas se vendendo como simples, o que é impossível. Estamos há décadas prendendo cada vez mais e o problema da violência não tem diminuído. Diante de situações de crise surgem propostas “mais do mesmo”.

Parece claro àqueles que estudam seriamente o tema que as respostas para problemas como segurança pública e encarceramento, se existem, estão fora das propostas que envolvem mais Direito Penal e mais prisão. Assim, a ausência de mortes violentas registradas oficialmente em 2016 no ES, não o qualifique como “modelo a ser seguido” em matéria prisional. Infelizmente, tanto o Brasil como o ES estão longe disso.

Artigo publicado no portal Justificando.

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