Artigo: O dever do advogado criminalista | Por Cássio Rebouças
Artigo 23 do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil. “É direito e dever do advogado assumir a defesa criminal sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado”. Parágrafo único. “Não há causa criminal indigna de defesa, cumprindo ao advogado agir, como defensor, no sentido de que a todos seja concedido tratamento condizente com a dignidade da pessoa humana, sob a égide das garantias constitucionais”.
Todos têm, por lei – e o Estado tem o dever de garantir -, direito à defesa técnica, sendo esta uma garantia existente em todo Estado Democrático de Direito, para todo e qualquer acusado de crime. A defesa técnica é obrigatória, direito do cidadão e necessária ao exercício da cidadania contra o arbítrio estatal. Giuseppe Zanardelli, jurista italiano, já ensinou: “Ante a justiça primitiva, pois o patrocínio de uma causa má não é só legítimo, senão ainda obrigatório; porquanto a humanidade o ordena, a piedade o exige, o costume o comporta, a lei o impõe”.
Não cabe ao advogado contratado para o exercício da defesa criminal prejulgar o cliente que nele confia. Quando, em 1911, Evaristo de Morais escreveu a Ruy Barbosa com dúvidas se assumiria a defesa criminal de um adversário político, este foi categórico em uma carta que desde então ficou gravada na história do Direito brasileiro e recebeu o nome de O dever do advogado: “Recuar ante a objeção de que o acusado é ‘indigno de defesa’ era o que não poderia fazer o meu douto colega, sem ignorar as leis do seu ofício, ou traí-las. Tratando-se de um acusado em matéria criminal, não há causa em absoluto indigna de defesa”.
Nesse sentido, o Código Penal prevê o crime de patrocínio infiel para o advogado que trai o cliente: “Artigo 355 – Trair, na qualidade de advogado ou procurador, o dever profissional, prejudicando interesse, cujo patrocínio, em juízo, lhe é confiado: pena de detenção de seis meses a três anos e multa”.
Vergonhoso é ver um profissional da advocacia aceitar o múnus de uma defesa criminal e não apenas abandonar o cliente, mas fazê-lo de forma a condená-lo. Se não é o caso de prosseguir na defesa, o advogado deve sair calado. Se o que se espera da profissão é a obtenção de aplausos e elogios, a advocacia criminal não é uma boa escolha. Desagradar as maiorias, tornando-se, por vezes, o inimigo público número um, faz parte e todo advogado está ciente disso. A opinião pública não deve pautar a atuação do defensor e quanto mais a turba busca o linchamento do acusado mais altiva e combativa deve ser a defesa.
Advocacia criminal é coisa séria e na defesa da liberdade não há espaço para aventureiros.
Artigo originalmente publicado pelo jornal A Gazeta e pelo portal Gazeta Online.